Mito ou Verdade? - As bebidas vegetais são uma boa opção para os bebés e crianças.
sexta-feira, 29 de novembro de 2019
Numa altura em que o vegetarianismo e veganismo estão a ganhar força, quer por motivos ambientais, éticos ou de saúde, se num indivíduo adulto é necessário existir um grande planeamento da alimentação de forma a evitar desequilíbrios nutricionais, na infância este cuidado deve ser redobrado!
As bebidas vegetais constituem uma alternativa aos laticínios para indivíduos alérgicos à proteína do leite de vaca ou intolerantes à lactose - o açúcar naturalmente presente no leite e derivados - sendo também a escolha de quem opta, apesar de não ter indicação médica, mas alguma motivação pessoal, por não consumir ou reduzir a ingestão de alimentos de origem animal.
A composição destas bebidas baseia-se sobretudo em água, hidratos de carbono e, sobretudo no caso de bebida de soja, também em proteína.
Serão, então, as bebidas vegetais interessantes em termos nutricionais e uma boa alternativa aos laticínios?
Depende!
- A composição nutricional poderá ser mais ou menos interessante dependendo do facto da bebida vegetal ter ou não açúcar adicionado, sendo este um dos grandes problemas de grande parte destas bebidas, acabando por, muitas vezes, se assemelharem mais a um refrigerante, cuja composição é maioritariamente água e açúcar, do que leite (designação que apenas deve ser usada relativamente ao produto proveniente de mamíferos, nunca de origem vegetal).
- Para além disso, em termos de proteína, à exceção da bebida de soja que tem uma quantidade semelhante (3,7g por 100mL vs 3,4g por 100mL no leite de vaca), nas restantes versões este macronutriente está presente em quantidades bastante reduzidas. Por outro lado, a proteína presente nos laticínios é considerada de alto valor biológico, ou seja, é constituída por todos os aminoáciodos essenciais, ao passo que nas bebidas vegetais não, sendo menos completa e apresentando também uma menor digestibilidade.
- Um outro aspeto a ter em conta na escolha de bebidas vegetais é a sua composição em micronutrientes, ou seja, em vitaminas e minerais. Regra geral, estas bebidas são mais pobres em micronutrientes, como cálcio, ferro, B12 e vitamina D, comparativamente aos laticínios. Apesar de muitas das bebidas já serem fortificadas nestes nutrientes, a biodisponibilidade, ou seja, a absorção e assimilação pelo nosso organismo, é bastante menor do que no leite e derivados.
- A bebida de arroz está contraindicada nos lactantes e crianças devido ao seu teor em arsénio inorgânico, considerado carcinogénico. De modo a reduzir a exposição infantil ao arsénio, a ESPGHAN - Sociedade de Gastrenterologia, Hepatologia, Nutrição Pediátrica - recomenda que não sejam oferecidas bebidas de arroz nestas faixas etárias.
- No caso de bebida de soja, o mais prudente parece ser também não incluir nesta fase, pelo menos em crianças pequenas, devido ao seu teor em fitatos e fitoestrogénios, uma vez que os efeitos da exposição precoce a estes compostos a médio e longo prazo são ainda desconhecidos.
Tendo em conta estes motivos, as bebidas vegetais não devem ser introduzidas antes dos 24 meses (e preferencialmente após os 36 meses) e nunca devem substituir uma fórmula infantil, uma vez que não fornecem quantidades suficientes de energia, proteína, cálcio e vitaminas C, D, E e niacina (B3).
Quando utilizadas, as bebidas vegetais podem ser oferecidas apenas ocasionalmente, nas versões simples, com baixo teor de açúcar (<5g/ 100g de produto) e sem adição de chocolate ou baunilha, de forma a não promover a preferência da criança por bebidas doces.
O consumo de laticínios está associado a uma redução do risco geral de doenças cardiovasculares e alguns tipos de cancro, como o cancro coloretal, gástrico e da mama, sendo bastante interessantes do ponto de vista nutricional. Com exceção de situações de alergia ou intolerâncias, podem e devem ser incluídos na alimentação de miúdos e graúdos!
Maria Inês Cardoso
Os irmãos dos bebés prematuros
quarta-feira, 27 de novembro de 2019
O nascimento de um bebé prematuro afeta não só os pais, mas também os outros membros da família. Tudo muda. O trabalho, a família os outros filhos e os pais passam a viver consoante as rotinas das UCIN e vários são os ajustamentos que têm que fazer nas suas vidas. A complexidade das emoções e a tensão constante vividas pelos pais durante este período, podem potencialmente afetar a segurança no relacionamento com os outros filhos e a vida familiar. Existe assim um risco aumentado de problemas, incluindo stress familiar e os filhos que estão em casa podem viver igualmente a situação com ansiedade e sentirem-se desapoiados. Por vezes, a ausência de apoio de outros familiares aumenta ainda mais os níveis de stress dos pais e fá-los sentirem-se culpados por não se encontrarem tão disponíveis para os outros filhos.
O que os irmãos podem sentir?
A idade dos irmãos tem importância na compreensão das razões pelas quais o bebé, que estava na barriga e já nasceu, não pode ir para casa; o que é isso de nascer tão pequenino e porque os pais parecem diferentes (já não sorriem tanto, andam mais tristes, estão com menos paciência, estão mais ausentes, ...). Podem sentir que estão a ser "abandonados", que se calhar os pais já não gostam tanto deles, ou ainda que podem ter feito alguma coisa e por isso os pais se estão a afastar.
É ainda natural que a criança passe por um período em que surgem algumas mudanças de comportamento. Maior agitação, birras frequentes, raiva, chamadas de atenção, alterações do sono, ciúme, problemas na escola e outras mudanças no comportamento, são reveladoras do sentir da criança face às alterações na sua vida familiar. É ainda natural que possam surgir comportamentos mais regressivos e imaturos, tais como querer outra vez a chucha, biberão, ... devendo os pais, nesta fase, serem mais tolerantes.
Por vezes os pais dizem: "É pequena, ainda não percebe bem o que está a acontecer", mas é um erro tremendo, dado a criança perceber à sua maneira que o olhar e comportamento dos pais está diferente. A criança fica assustada e pode sentir que a segurança do relacionamento com os pais e das suas rotinas familiares se encontra ameaçada.
Quando a criança é mais velha, a sua capacidade de compreensão é diferente. No entanto, a vivência emocional e as alterações à sua vida diária obrigam a novos reajustamentos para os quais não estavam preparados e podem ser difíceis de lidar.
Como é que os pais devem lidar com a situação, de forma a encontrar um equilíbrio?
Para ajudar os irmãos mais velhos a se adaptarem mais facilmente às ausências e preocupações dos pais com o novo bebé prematuro, é necessário fazer com que a criança se sinta envolvida. Nada pior para esta quando os pais, por desconhecimento, a deixam sozinha tentando "protegê-la" das preocupações. Ao fazer isto, imagino que com a melhor das intenções, estão a deixar a criança entregue aos seus próprios medos e aflições (por mais que se tente esconder, a criança percebe), sem apoio e segurança por parte dos pais.
Algumas DICAS podem ajudar:
- os pais devem tentar, sempre, explicar de modo simples e numa linguagem adequada à idade da criança, o que aconteceu;
- tentar terem tempo para estar com os filhos mais velhos. Embora seja difícil, muitas das vezes, os pais afastarem-se das unidades e irem para casa, é importante conseguirem um equilíbrio com os filhos que estão em casa. Eles também precisam (da mesma forma que os pais), pois sentem-se confusos e assustados com o que se está a passar;
- os pais não devem ter medo de falar de forma simples, do que sentem e dos seus receios com os filhos mais velhos, bem como devem dar espaço para que eles também se possam expressar;
- é importante que os pais reforcem o amor para com os filhos mais velhos. É importante que os pais digam e façam sentir que continuam a ser amados, que continuam a ser importantes e que, todos juntos enquanto família, vão conseguir ultrapassar. Aqui o sentimento de unidade familiar transmite coesão e segurança;
- importante introduzirem o bebé da realidade aos irmãos mais velhos. Podem levar fotografias ou outros pertences, de modo a que o bebé comece, progressivamente, a tornar-se mais real e menos abstrato para os irmãos. Este aspeto é importante, pois facilita a integração do bebé no seio da família: "Afinal existe!";
- sempre que possível, de acordo com as regras das unidades de internamento, devem levar os irmãos a visitar (ver) o bebé. A realidade da existência de uma bebé é importante.
- com crianças pequenas o brincar e o fazer de conta é uma boa estratégia para os ajudar. Por exemplo:
- arranjar um boneco para que a criança, em casa, possa cuidar dele como um bebé prematuro e uma caixa para fazer de incubadora, ...;
- dizer à criança para fazer um desenho ou para escolher um brinquedo para o bebé;
- gravar (hoje com o telemóvel é fácil) uma mensagem da criança para o bebé;
- criar uma storyboard acerca do bebé e partilhá-la com a criança mais velha;
- realizar atividades que não tenham nada a ver com o bebé.
- é importante, sempre que possível, tentarem ter ajuda em casa. Avós e outros familiares podem ajudar os pais a cuidar da(s) criança(s) que está(estão) em casa, garantindo alguma estabilidade nas rotinas e compensação efetiva;
- quando o bebé tem alta, continua a ser importante prepará-lo(s) e explicar o que vai acontecer, envolvendo-o(s), carinhosamente, nos cuidados.
Em conclusão, não é uma tarefa fácil, dado serem várias as exigências e as tarefas psicológicas com que os pais se têm que confrontar, quando do nascimento de um bebé prematuro. A existência de outros filhos aumenta a pressão pelas preocupações acrescidas com o seu bem-estar.
Para as crianças também não é fácil sentirem que de repente o seu mundo ficou de pernas para o ar. A segurança e a estabilidade familiar sofreram alterações e o sentimento que predomina é a ameaça. Independentemente da idade, que possibilita uma maior ou menor compreensão da situação, torna-se importante que os pais envolvam os outros filhos, num esforço conjunto e que consigam manter um equilíbrio na atenção e disponibilidade afetiva para com todos os seus filhos... em casa e na unidade.
Lília Brito
Endometriose
quarta-feira, 20 de novembro de 2019
A endometriose afeta cerca de 10 a 15% das mulheres em idade fértil. Caracteriza-se pela presença de tecido foro do útero que deveria estar localizado dentro do útero (endometrial). Esta localização pode ser nos órgãos ou áreas em redor do útero, como ovário, peritoneu, fundo-saco, colo do útero ou vagina ou em localizações à distância, como por exemplo pulmão, umbigo ou cicatrizes.
Apesar de se tratar de uma doença benigna, pode ter impactos tremendos na qualidade de vida das doentes, com implicações a nível pessoal, social e familiar. Isto porque a sintomatologia pode ser tão incapacitante, que motiva ao planeamento dos dias em que a dor será mais intensa. A etiologia é desconhecida, existem algumas teorias, mas nenhuma delas explica totalmente a doença.
E que sintomas incapacitantes são estes?
A DOR é o sintoma dominante. Esta dor pode manifestar-se durante a menstruação, tratando-se de uma dor tipo cólica, de agravamento progressivo - dismenorreia secundária, sendo este tipo de dor o mais prevalente. Pode também existir dor nas relações sexuais, dor a evacuar ou urinar ou mesmo dor pélvica crónica.
A Infertilidade está sempre associada à endometriose?
Endometriose não é igual a infertilidade. No entanto, sabe-se que cerca de 30% das mulheres com endometriose têm infertilidade e que, das mulheres com infertilidade, cerca de 25 a 50% têm endometriose. Para a suspeição deste diagnóstico é fundamental uma história clínica completa e orientada à caracterização das queixas. É importante um exame objetivo atento e também direcionado à avaliação/ inspeção e palpação de algumas localizações específicas, como por exemplo o fundo saco posterior. Os exames complementares de diagnóstico, como a ecografia e a ressonância pélvica também podem ajudar e por vezes são necessários mais exames para avaliar os órgãos envolventes. O tratamento vai ser individualizado, mediante os achados, as queixas e os objetivos de cada mulher. Poderá passar pela terapêutica médica, essencialmente com tratamento hormonal até à cirurgia. A endometriose é muitas vezes subdiagnosticada, existindo frequentemente um atraso no diagnóstico. Tem um impacto importante na qualidade de vida das mulheres e por isso temos de, sem dúvida, valorizar as queixas de dor... porque todos merecemos viver sem dor!
Patrícia Isidro Amaral
Da experiência profissional à pessoal...
domingo, 17 de novembro de 2019
Há 12 anos...
... eu tinha 28 anos, já era enfermeira e trabalhava na área que sempre tinha idealizado no decurso do curso de enfermagem - a Neonatologia!!
Sentia (e sinto) um orgulho enorme por trabalhar com os maiores guerreiros, os bebés que nascem antes do tempo! Sem peso, sem maturidade, tão frágeis, mas com tanta coragem e força!!
A par disto, o meu desejo de ser Mãe era muito grande e em junho desse ano tivemos a boa nova!!! Estávamos grávidos!
A gravidez correu sem qualquer risco até às 22 semanas de gestação, altura em que, após a ecografia morfológica, foi detetado encurtamento do colo do útero e a partir daí passou de uma gravidez normal, para uma de alto risco. Deixei de trabalhar de imediato e fui para casa com indicação para repouso absoluto. Mas mesmo assim não o colo não estabilizou. As contrações e as hemorragias começaram... houve internamentos... repouso... medicação... mas com 27 semanas já não se conseguiu parar o trabalho de parto e o Francisco nasceu!
Nasceu com 849g e 32cm. Eu sabia tudo o que ele iria passar nascendo tão pequenino, o que fazia com que a minha tristeza, ansiedade e angústia fossem ainda maiores. Não queria que o meu filho passasse por esse sofrimento, por técnicas dolorosas, por manipulações excessivas... Sabia que ele não iria poder ter o colo dos Pais e nós iríamos passar por dias de internamento difíceis e que iriam parecer infinitos. Alguns dias de sucessos e muitos de retrocessos.
E assim foi!!! Dois meses e meio de internamento. O Francisco esteve ventilado, fez várias infeções, o oxigénio era a sua grande dependência e, mesmo com ele, pregava grandes sustos ao deixar de respirar. Mas devagarinho foi crescendo, ganhando peso e maturidade para sair da incubadora, que o protegia e aquecia.
Um dos dias mais difíceis e que nunca irei conseguir esquecer foi quando tive alta da Maternidade, dois dias depois do Francisco nascer. Saí da Maternidade e cheguei a casa sem o meu filho. Uma sensação de vazio que ainda hoje dói.
O Francisco teve anta uma semana antes da data prevista, caso tivesse sido uma gravidez de 40 semanas. Tinha quase 2kg e tinha conseguido ultrapassar todas as adversidades da prematuridade. Hoje tem 12 anos e é um miúdo saudável e feliz!
A neonatologia passou a fazer parte da minha vida pessoal e da profissional. Compreendia, agora, o outro lado. E, apesar de ter doído muito, valeu a pena!
Por isso abracei este projeto de coração cheio.
"o pai, a mãe e eu" tem proporcionado sensibilizar a população para a problemática da prematuridade, capacitando as Famílias para uma situação que qualquer uma pode ter de enfrentar, quando menos esperar.
Filipa Soveral
(o pai, a mãe e eu)
Fui mãe antes do tempo!
quinta-feira, 14 de novembro de 2019
Foi a minha primeira gravidez, o meu primeiro parto, o meu primeiro filho.
O Duarte nasceu às 33 semanas. Eram 6h quando tive rutura de membranas. Nunca imaginei que tanta água podia sair de dentro de mim. Fui logo para o hospital. Às 9h comecei com contrações de 3 em 3 minutos e não deu tempo para nada. Entrei na sala de partos onde estive até às 15h. Foram horas de muita dor, muito sofrimento e sem saber o que se estava a passar. Três obstetras tentaram parto natural, mas no fim evoluiu para cesariana, com anestesia geral.
Quando acordei perguntei pelo Duarte. Estava na Neonatologia, em intensivos e só o pude ver no dia seguinte, às 9h30 da manhã.
Foi um choque muito grande. Tão pequenino dentro da incubadora, cheio de fios e tubos, monitores a tocar... ainda hoje consigo "ouvir" cada som daquela sala.
A primeira coisa que senti foi que não era mãe. Aquele menino pequenino pertencia àqueles "encantadores de bebés", os enfermeiros, que tão bem cuidavam dele. Queria tanto saber o que se passava, mas nem sabia o que perguntar. As respostas eram sempre as mesmas: "Um dia de cada vez, mamã!" Agora sei o que isso significa. Aquele ser tão pequenino ensinou-me a VIVER, a viver de verdade!
Tudo era muito difícil: as noites na maternidade com um berço vazio ao lado; uma alta de colo vazio; tirar leite com uma bomba, de 3 em 3h e só ao 5º dia começar a sair leite (o ouro para o meu pequeno); as noites em casa, com o som de fundo da sala dos intensivos; as chegadas pela manhã, cheia de medo do que poderia encontrar...
E foi então que comecei a sentir que era mãe! Tinha o Duarte 10 dias... foi o melhor dia... fizemos canguru e foi a primeira vez que lhe peguei ao colo.
Aos poucos os fios começaram a diminuir, saímos dos intensivos e comecei a cuidar do Duarte, do meu FILHO!
A alta cada vez mais perto e mais medos... novos medos... medo de ir para casa, medo das visitas, medo dos vírus, medo de outro internamento... O dia da alta agora é lembrado quase como o que em que nasceu.
Aos poucos as coisas vão se compondo e os medos vão diminuindo. Os nossos pequenos ganham um título para toda a vida: Guerreiros!
Agora tem quase 5 anos. Um menino cheio de saúde, energia e boa disposição!
Um menino FELIZ!
E eu também!
Mãe vamos brincar
Início da alimentação diversificada na criança nascida pré-termo: quando, como e com que alimentos?
quarta-feira, 13 de novembro de 2019
O início da alimentação diversificada é sempre um marco importante na vida da família e pode envolver alguma insegurança, quando se trata de uma criança prematura.
A primeira dúvida costuma surgir em relação ao tempo certo.
É necessário quando...
... o leite materno ou fórmula láctea deixam de suprir todas as necessidades nutricionais da criança. Para a maioria, sabe-se, esta insuficiência faz-se sentir por volta dos 6 meses de idade cronológica.
Recomendações nutricionais para crianças nascidas pré-termo são diferentes das crianças de termo, porque aquelas têm necessidades aumentadas. Acresce ainda o facto de terem reservas limitadas, porque perderam o 3º trimestre da gravidez, altura em que é feita a acumulação de nutrientes.
É possível quando...
... existe a capacidade para retirar alimento da colher, já que o biberão deve ser utilizado apenas para oferecer leite, fórmula láctea e água.
Se bem que alguns autores refiram que o internamento prolongado, entubação e aspiração atrasam a aquisição de competências para a alimentação, outros têm vindo a demonstrar que a maioria das crianças nascidas pré-termo têm desenvolvimento motor suficiente para iniciar a diversificação alimentar entre os 5 e os 8 meses de idade cronológica - mesmo nos casos de prematuridade extrema.
Esta capacidade pode testar-se facilmente, utilizando uma pequena colher para oferecer as vitaminas habituais.
Desconhece-se ainda se as competências para comer estão programadas e aparecem, aconteça o que acontecer, ou se são influenciadas pelos estímulos orais. Tem vindo a constatar-se, contudo, que a falta desses estímulos se associa a dificuldades alimentares, mais tarde. Mesmo tratando-se de crianças nascidas prematuras, o atraso no início da alimentação diversificada pode condicionar resistência a ingerir qualquer coisa que não seja leite, além de recusa persistente em comer com colher, levando a que o cansaço da família fale mais alto e acabe, a "comer" sopa e tudo o que for possível, pelo biberão!
É seguro quando...
... os novos alimentos não constituem fator de agressão.
Em termos de segurança nomeadamente em relação a eventuais episódios de alergia alimentar ou sobrecarga renal, as notícias têm sido animadoras.
Segundo alguns estudos recentes, apesar da imaturidade das crianças pré-termo, não há evidência de que o início precoce de novos alimentos aumente a incidência de doenças atópicas. O risco de alergia alimentar parece não se colocar especialmente nas crianças prematuras, porque a permeabilidade do intestino diminuiu nos primeiros dias de vida, independentemente da idade gestacional e do peso ao nascer.
Também a maturação da função renal ocorre em função da idade cronológica, independentemente da idade gestacional ao nascer. Este aspeto é tranquilizador quando precisamos de aumentar a densidade nutricional dos alimentos, uma vez que as necessidades nutricionais das crianças nascidas pré-termo são elevadas e a sua capacidade gástrica é limitada.
Com que alimentos, então?
No momento de escolher os alimentos para a criança prematura, devemos ter consciência do seu percurso no início da vida. Se por algum motivo existiu um período de restrição nutricional, que induziu restrição de crescimento pré-natal ou imediatamente após o crescimento, é sensato refrearmos um pouco a nossa tentação de ir em busca das calorias perdidas! O organismo adapta-se sempre ao meio, numa tentativa de sobrevivência. Assim, uma oferta calórica exagerada imediatamente a seguir a um período de "carência", tende a predispor as crianças para a obesidade e toda a panóplia de situações que lhe estão associadas.
O aporte calórico deve ser o necessário para lhe proporcionar um padrão de crescimento saudável, sendo que um bebé, prematuro ou não, nem sempre precisa de comer papas.
Muito para lá das calorias e das proteínas, é necessário ter em conta outros nutrientes (ferro, zinco, iodo, vitaminas, ...) que embora em quantidades menores, são indispensáveis ao crescimento - o cérebro é particularmente sensível à carência destes micronutrientes!
Por outro lado, na escolha dos alimentos para qualquer criança (prematuras incluídas), devemos ter sempre presente que não só estamos a nutri-las, mas também a educá-las do ponto de vista alimentar. É fundamental insistir no treino de outros paladares que não o doce. Iniciar a alimentação diversificada com creme de legumes é uma opção saudável, não só pela sua riqueza nutricional, mas também porque é aqui que começa a educação alimentar das crianças.
E é simples assim! Respondendo a necessidades nutricionais, respeitando capacidades motoras, acautelando fragilidades individuais e colocando o foco na educação do paladar desde o início, temos uma receita de sucesso!
Manuela Cardoso
Quando a gravidez é passada na horizontal...
terça-feira, 12 de novembro de 2019
Falar da minha gravidez é falar de um tempo não tão "cor-de-rosa", bem diferente das expetativas que tinha como mãe de "primeira viagem". É falar de uma fase "assombrada" desde cedo pela possibilidade de um parto pré-termo. Para poupar angústias a esta leitura, adianto já: connosco correu tudo bem.
Mentiria se dissesse que a gravidez foi "pêra doce". Foi uma aventura repleta de desafios e muitas limitações, sem direito a uma vivência em pleno desta fase e a provar que cada gravidez é única e imprevisível. Da gravidez, não tenho registos - não houve margem para sessões fotográficas bonitas, dessas que enchem as redes sociais, porque imperou a "ditadura" do repouso absoluto desde cedo.
Desde cedo também que a barriga de "lua cheia", demasiado grande, levantava suspeitas para um quadro clínico que nunca tinha ouvido falar: hidrâmnios - excesso de líquido amniótico. Na minha ingenuidade, sempre achei que ter muito líquido fosse positivo, mas certo é que a barriga pesava muito (muito mesmo) e logo a médica mandou abrandar. Seguiram-se largas dezenas de consultas e (tantos!) exames - a mim e ao bebé, para averiguar a razão de tanto líquido. Somaram-se sustos e os inevitáveis nervos associados aos diferentes riscos - que se foram riscando pouco a pouco: a diabetes gestacional, os problemas da tiróide, malformação fetal (incluindo malformação cardíaca), infeções maternas... Quando o excesso de líquido foi finalmente considerado idiopático - sem causa aparente, nem por isso respirei de alívio. Continuava a ter uma gravidez de risco e um bebé inquieto, cheio de vontade de vir conhecer o mundo cá fora, cedo demais.
Durante esta gestação "horizontal", procurei informar-me o melhor que pude sobre a prematuridade. Porque o "Dr. Google" consegue ser cruel, tive o cuidado de procurar as melhores fontes de informação sobre o tema. Tive a sorte de meses antes (mesmo antes de engravidar), me ter cruzado profissionalmente com "o pai, a mãe e eu" (o Universo lá tem a sua maneira de funcionar, certo?), um projeto que muito admiro, para o qual tive oportunidade de trabalhar e que me havia alertado para esta temática e para as causas de bebés pré-termo, nomeadamente a idade gestacional (fui mãe aos 35) e o factor "stress" - para mim, um dos maiores inimigos de uma gravidez saudável.
Só voltei a respirar de alívio às 35 semanas (ainda assim seria considerado prematuro, mas à partida já não seria necessário fazer a maturação pulmonar para a qual nos fomos preparando mentalmente). Até lá, com uma ameaça de parto às 25 e um colo do útero bem curtinho, fiz do repouso regra e procurei "mergulhar" num mar de calma e pensamento positivo. Agarrei-me à ideia de que haveriam certamente mulheres na mesma situação para quem abrandar seria complicado ou impossível, e foi nisso que ganhei garra para fintar a solidão e a certa impaciência de passar dias e dias deitada (e dormente). Com um negócio próprio e com um estilo de vida pautado pelo stress, este "bicho-carpinteiro" que sou teve de aprender a sossegar - corpo e espírito - e acabei por decidir parar muito antes do que havia previsto, por mais difícil que isso fosse a vários níveis, incluindo monetários. Eu, que sempre me imaginei a trabalhar até à data do parto, não duvido um segundo de que abrandar terá feito toda a diferença nesta nossa vitória.
O Vicente nasceu às 38 semanas e, embora pequenino, nasceu livre de complicações. Hoje, com três mesinhos, é um bebé forte e de sorriso rasgado e continua a ensinar-me que às vezes só precisamos mesmo de tirar o pé do acelerador e rever as nossas prioridades. Serenar, cuidar e nutrir-nos enquanto fuuras mamãs é difícil numa sociedade que exige pressa e nos rouba tanto tempo, mas é, de facto, fundamental para darmos luz à vida. Espero que a sociedade esteja cada vez mais alerta e consciente disso - e do tanto que há ainda para fazer no nosso país em relação à prevenção da prematuridade.
A todas as futuras mamãs que me estão a ler agora, com ou sem gravidez de risco, um enorme e caloroso abraço e toda a energia positiva.
Rita Peres, mamã orgulhosa do Vicente
Fundadora do Taini Creative Studio
Manuela Cardoso
segunda-feira, 11 de novembro de 2019
É Nutricionista na Maternidade Dr. Alfredo da Costa e docente de Nutrição Pediátrica no Instituto Universitário Egas Moniz.
A Natureza em Montessori
quarta-feira, 6 de novembro de 2019
A educação das crianças de acordo com Maria Montessori é fascinante. Muito mais do que materiais pedagógicos ou decoração do quarto é essencialmente um novo olhar sobre a criança, um olhar de confiança nas suas capacidades, de escuta das suas necessidades, de atenção aos seus interesses. É, afinal, uma filosofia de vida.
Dentro dessa filosofia de vida, um dos aspetos com os quais mais nos identificamos enquanto família é a importância que é dada à Natureza. O ritmo de vida de muitas famílias hoje em dia deixa pouco espaço à Natureza que acaba por ser, muitas vezes, pouco valorizada, apesar de ser essencial, até mesmo vital, para o desenvolvimento da criança e para o bem-estar do adulto. São vários dos estudos que comprovam que o contacto com a Natureza contribui para a redução do stress nos adultos e dos défices de atenção nas crianças.
Cresci bastante rodeada pela Natureza e acredito que isso se traduziu numa bagagem preciosa que ajudou a construir a minha identidade. Adoro observar as minhas três crianças a descobrirem o mundo, a questionarem o que observam, a viverem as mudanças nas estações, a apanharem as folhas secas na floresta, a rebolarem na relva, a aproximarem-se, sem receio, das vacas e das ovelhas, quando visitamos os avós no Alentejo! O olhar maravilhado deles é, para nós adultos, o melhor presente.
Conhecer a Natureza à sua volta enriquece a criança. Permite-lhe desenvolver uma importante consciência ecológica, tão essencial para a proteção do planeta onde vivemos.
Maria Montessori considerava que ensinar a Cultura às crianças a partir dos 3 anos de idade, sensivelmente, permite-lhes tornarem-se indivíduos adaptados ao seu tempo e ao seu espaço. Trata-se no fundo de compreenderem o mundo que as rodeia, estudarem a vida à sua volta, sentirem que fazem parte desse mundo.
Nos ambientes educativos Montessori, as aprendizagens de temáticas relacionadas com a Natureza (Botânica, Zoologia, ...) são exploradas recorrendo a atividades pedagógicas muito variadas e recorrendo a um vasto material que foi criado por Maria Montessori e que encaminha a criança a questionar-se por si mesma e a descobrir as informações que procura. Esse material é sensorial e ligado ao real. Trata-se de um conjunto de atividades e de experiências com o objetivo de levar a criança a observar o ambiente, a manipulá-lo e a experimentá-lo. É, afinal, um convite para a criança se abrir ao mundo!
A melhor forma de a criança compreender a Natureza será sempre recorrendo à sua experiência sensorial. Por isso, é tão importante permitir que a criança possa, desde cedo, tocar com as suas mãos as folhas secas na floresta, sentir na sua pele a chuva, ou fazer festas ao gato, observar com os seus olhos as formigas atarefadas que se atravessam no seu caminho, cheirar as flores no jardim, ou a relva cortada, provar diferentes legumes recolhidos da sua horta, ouvir o chilrear dos pássaros ou os grilos ao anoitecer. Toda essa vivência sensorial é determinante na construção cerebral da criança.
No seu livro "De l'enfant à l'adolescent" publicado em francês pela editora Desclée de Brouwer, Maria Montessori escreve: "Nenhuma descrição, nenhuma imagem de nenhum livro pode substituir a observação real das árvores num bosque com toda a vida que ocorre à sua volta" (tradução livre do francês).
São, por isso, mais do que muitas as atividades que podemos apresentar às nossas crianças ligadas à natureza, seja em casa, ou nas escolas. Uma das nossas preferidas e que nos acompanha ao longo de todo o ano, é a mesa de observação da Natureza. É um dos elementos mais maravilhosos no ambiente preparado Montessori. Consiste numa pequena mesa onde colocamos elementos da Natureza que vão ser substituídos à medida que o tempo passa e em função das mudanças que nela ocorrem. A criança compreende assim o ritmo da vida e tem a oportunidade de guardar todos os pequenos objetos que recolhe nas suas brincadeiras e passeios no exterior, seja no jardim, na floresta, na praia, ... desde flores, conchas, avelãs, castanhas, folhas secas, até mesmo pequenos insetos... como se fossem pequenos tesouros! O resultado final fica lindo e permite-nos dar vida às estações do ano.
Indo ao encontro dos interesses e da curiosidade da criança, devemos também deixar que ela observe naturalmente os insetos que abundam nos jardins, nos parques, nos bosques, ... Uma das ferramentas mais comuns aos pequenos exploradores montessorianos é a lupa. As crianças aprendem a manusear a lupa desde muito cedo, porque são fascinadas por tudo o que é pequeno, gostam de observar os detalhes, isso ajuda-as a compreender melhor o que existe à sua volta. Então, porque não deixamos as nossas crianças observar os pequenos insetos à lupa? E complementarmos essa descoberta com livros sobre insetos? Esse encontro entre as descrições dos livros e o que a criança observa no real é uma fonte inesgotável e riquíssima de conhecimento para a criança.
Outra forma de sensibilizarmos as nossas crianças para a Natureza e para o seu papel crucial na sua preservação, é atribuirmos-lhe desde cedo as tarefas como cuidar das flores (regar as flores, retirar as folhas secas, ...), colocar sementes na terra e cuidar delas para ver o seu crescimento acontecer e compreender assim o ciclo da vida, cuidar dos animais (dar comida ao cão ou ao gato, recolher os ovos das galinhas, ...).
Maria Montessori defendia que a criança pequena é um explorador sensorial que absorve os elementos ao seu redor pelo simples facto de existir. E a Natureza é, inegavelmente, o melhor ambiente sensorial de sempre, por isso, não hesitem em deixar as vossas crianças explorara Natureza o mais livremente possível!
Sylvia de Sousa Guarda
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