As alergias... o que são?
quarta-feira, 28 de novembro de 2018
As doenças alérgicas estão a aumentar em todo o mundo e manifestam-se de formas cada vez mais complexas e graves. Estima-se que entre 20 e 30% da população portuguesa possa ser afetada por um ou mais problemas alérgicos como asma, rinite, eczema, urticária e alergia a alimentos ou a medicamentos. Este aumento de frequência é particularmente problemático nas crianças que são desproporcionalmente afetadas.
O que é a alergia?
A alergia é uma resposta exagerada e inadequada do nosso Sistema Imunitário contra substâncias inofensivas do meio ambiente. Numa situação normal, o nosso organismo combate agentes que possam causar doenças, como bactérias ou parasitas e "tolera" substâncias benéficas como os alimentos, o ar que respiramos ou os medicamentos.
Nas pessoas alérgicas, o organismo cria anticorpos que interpretam incorretamente uma substância inofensiva (um alergénio) como um agressor. Esses anticorpos existem no nariz, nos olhos, nos brônquios, na pele e no sistema digestivo e causam uma inflamação intensa que origina os sintomas típicos da alergia.
E então, porque nos tornamos alérgicos?
Chamamos "atopia" à predisposição genética, pessoal ou familiar, para a produção desses anticorpos peculiares contra os alergénios do meio ambiente. Quando falamos de uma pessoa atópica, queremos dizer que tem essa predisposição codificada nos genes.
Uma criança com um progenitor alérgico, por exemplo, tem 40 a 60% de risco de também vir a ter alergia. Se os dois pais foram alérgicos, a probabilidade aumenta para 60 a 80%. Pelo contrário, o risco é muito baixo (aproximadamente 5%) se não existir alergia na família.
Mas as doenças alérgicas são multifatoriais, isto é, são influenciadas tanto pela genética como por factores ambientais. As infeções respiratórias virais e a exposição a poluentes, sobretudo ao fumo de tabaco parecem ser igualmente importantes para o aparecimento de problemas alérgicos. Além disso, o sedentarismo, a obesidade e o menor contacto com a natureza também parecem contribuir para a epidemia de alergia que surgiu no final do século XX.
As alergias estão mesmo a aumentar? E proporcionalmente há mais crianças ou adultos alérgicos?
Não parece haver dúvidas de que as doenças alérgicas são cada vez mais frequentes, sobretudo nas crianças. Estima-se que em Portugal aproximadamente 10% da população (cerca de 1 milhão de pessoas) sofra de asma brônquica. E na idade pediátrica essa percentagem é ainda maior, cerca de 15%. Além disso, mais de 20% das crianças portuguesas têm queixas de rinite, 10% têm eczema atópico e de 5 a 10% sofrem de alergia alimentar.
A prevalência de todas estas doenças praticamente duplicou nos últimos 25 anos.
Porque somos alérgicos a umas substâncias e não a outras?
Regra geral, somos alérgicos a substâncias comuns do nosso meio ambiente. Por exemplo, os habitantes do Algarve são alérgicos aos pólenes e aos ácaros da região, que são diferentes daqueles que são encontrados no Norte de Portugal e daqueles que existem noutros países. Cada região tem as suas particularidades.
Em Portugal, a alergia respiratória identificada mais frequentemente é aos ácaros do pó doméstico, sobretudo a uma espécie chamada Dermatophagoides pteronyssinus. Os ácaros são pequenos animais que vivem no pó das casas, em especial nos quartos de dormir. Alimentam-se de restos da nossa pele e preferem casas quentes e húmidas. Cresce, sobretudo nos colchões, almofadas, alcatifas, sofás e peluches, mas podem viver em qualquer sítio que acumule pó.
Já os pólenes mais importantes para o aparecimento de alergia respiratória parecem ser os de gramíneas selvagens (também chamados de fenos) e de oliveira.
Ser alérgico "é para a vida"?
Depende. Regra geral o Sistema Imunitário dos doentes alérgicos continua a reconhecer os alergénios a que se sensibilizou durante toda a vida. Muitas vezes até adquire novas sensibilizações que fazem com que a doença se agrave!
Ainda assim, a frequência dos sintomas de asma e de eczema tem uma tendência para diminuir nos adultos. Por outro lado, a prevalência de rinite alérgica parece aumentar com a idade e a alergia alimentar pode ser transitória ou "para a vida" de acordo com o alimento implicado (a alergia ao leite e ao ovo têm muito melhor prognóstico que a alergia ao camarão ou aos frutos secos).
É impossível prevenir alergias?
Nas crianças existem algumas atitudes que podem fazer muita diferença. O aleitamento materno exclusivo durante os primeiros 6 meses de vida é recomendado a todos os recém-nascidos tanto pelo seu valor nutricional, como pela capacidade que tem em regular corretamente o Sistema Imunitário. Esta medida parece ter um valor protetor no desenvolvimento de várias alergias, sobretudo o eczema, a asma na infância e a alergia alimentar. Quando não é possível amamentar, ou quando o leite materno não é suficiente, as fórmulas hipoalergénicas de leite hidrolisado parecem ser superiores às fórmulas normais ou às fórmulas de soja na prevenção de alergia em crianças com pais alérgicos.
Por fim, a exposição ao fumo do tabaco (e menos frequentemente ao fumo da lareira) durante a gestação, no recém-nascido e na primeira infância parece ser incrivelmente prejudicial para o desenvolvimento pulmonar da criança.
Ainda assim, mesmo quando se têm todos os cuidados, por vezes a alergia surge. Felizmente a Medicina tem acompanhado este momento progressivo das doenças alérgicas e existem hoje diversos meios de diagnóstico e de tratamento para minimizar e mesmo reverter o impacto que estas têm na qualidade de vida dos doentes.
Pedro Morais Silva
Pedro Morais Silva
segunda-feira, 26 de novembro de 2018
Atualmente coordenador da consulta de Alergologia e Imunologia Clínica do Grupo HPA Saúde, exercendo atividade clínica nas Unidades Hospitalares de Alvor (Portimão) e de Gambelas (Faro) e na Clínica Particular do Algarve (Albufeira).
É assistente convidado de Imunologia do Departamento de Ciências Biomédicas e Medicina da Universidade do Algarve.
É secretário do Grupo de Interesse de Cuidados de Saúde Primários, da Sociedade Portuguesa de Imunologia Clínica e membro da European Academy of Allergy and Clinical Immunology.
Tem interesse especial em alergia alimentar, anafilaxia e doenças alérgicas da infância. Empenhado em educação para a saúde e na diminuição do impacto da alergia na qualidade de vida diária das crianças e cuidadores.
Está na hora de pensar... Como estás a respirar?
quarta-feira, 21 de novembro de 2018
Provavelmente nunca pensamos como respiramos... Será que o meu filho respira pelo nariz ou pela boca? Qualquer um de nós já experimentou a sensação pouco agradável de ter o nariz entupido e ter de respirar pela boca.
As funções do nariz são inspirar, cheirar e auxiliar na fala, logo a respiração nasal é fundamental. O nariz funciona como um filtro que aquece e humidifica o ar antes de chegar ao pulmão, melhora a capacidade dos pulmões absorverem oxigénio e aumenta a sua elasticidade. A respiração nasal promove um crescimento e desenvolvimento harmonioso das estruturas ósseas e músculos da face e das funções orais, tais como a fala, mastigação e deglutição.
O bebé quando nasce tem uma respiração exclusivamente nasal. Na infância são vários os fatores que podem contribuir para a respiração oral, justamente numa idade em que as consequências são maiores.
Porque respiramos pela boca?
A respiração oral instala-se por um processo obstrutivo do nariz que pode ser temporário, como no caso de uma infeção respiratória, ou mais prolongada, se for causada por hipertrofia das amígdalas e/ ou adenoides, desvio no septo, problemas alérgicos, ...
Respirar pela boca pode considerar-se normal durante a fala ou canto e exercício físico.
Como podemos identificar sinais e sintomas do respirador oral?
A criança respirador oral permanece frequentemente com a boca entreaberta, apresenta com frequência olheiras, narinas estreitas e a musculatura da face encontra-se flácida. Pode existir uma tendência para o mau hálito (halitose), rouquidão e desenvolvimento de cáries.
A respiração diurna e/ ou noturna pode ser ruidosa, a mastigação é rápida e pouco eficaz e existe preferência por alimentos moles.
Quais as consequências da respiração oral?
Respirar pela boca ocasiona prejuízos, tais como:
- alterações posturais (projeção da cabeça);
- alterações na oclusão dentária e crescimento mandibular;
- flacidez dos músculos orais, palato alto e estreito, postura incorreta da língua;
- alterações na mastigação e deglutição;
- alterações na fala e ressonância da voz;
- sonolência e irritabilidade;
- dificuldades de concentração.
Como resolver o problema?
Os pais devem ensinar e incentivar a criança a realizar uma higiene nasal adequada. Aprender a assoar o nariz é uma tarefa importante.
Na presença de alguns dos sintomas deve procurar-se um médico otorrinolaringologista para realizar um diagnóstico e tratamento precoce, que varia conforme a causa do problema.
No caso de não existir obstrução, a respiração oral pode manter-se como um hábito adquirido. O terapeuta da fala poderá ensinar técnicas que promovam uma respiração nasal eficaz, assim como fortaleçam a musculatura e corrijam alterações da fala, mastigação e deglutição.
Leonor Fontes
Persistência do canal arterial (PCA) em recém-nascidos prematuros
quarta-feira, 14 de novembro de 2018
O que é o canal arterial?
O canal arterial é um pequeno vaso sanguíneo que une as duas principais artérias do coração - a artéria pulmonar (principal artéria que transporta sangue não oxigenado para os pulmões) e a aorta (principal artéria que transporta sangue com oxigénio para todas as partes do corpo do bebé). Antes do nascimento, os pulmões do bebé não funcionam! Vai ser através da respiração da mãe e posteriormente da placenta que o bebé recebe o oxigénio necessário à sua sobrevivência. O canal arterial é a estrutura que permite que o sangue seja desviado dos pulmões (portanto, da artéria pulmonar) e chegue a todas as partes do corpo do bebé (através da artéria aorta).
Após o nascimento e à primeira respiração do bebé, o canal arterial torna-se desnecessário, ocorrendo o seu encerramento nos primeiros dias ou semana de vida. No entanto, por vezes o canal arterial não encerra completamente, permanecendo aberto. A isto dá-se o nome de persistência do canal arterial (PCA). No recém-nascido (RN) pré-termo, principalmente no RN de muito baixo peso, existe um risco elevado de persistência de canal arterial, ocorrendo em 20-40% dos bebés com peso de nascimento inferior a 1000g.
O nosso coração tem quatro câmaras. Duas câmaras "recetoras" - as aurículas direita e esquerda - e duas câmaras de bombeamento - os ventrículos direito e esquerdo. A artéria pulmonar e aorta estão conectadas respetivamente ao ventrículo direito e esquerdo. O sangue rico em oxigénio flui do ventrículo esquerdo para a aorta e depois para o resto do corpo. O sangue pobre em oxigénio flui do corpo para a aurícula direita, depois para o ventrículo direito e para a artéria pulmonar e desta para os pulmões, onde ser vai reabastecer de oxigénio fresco (oxigenação). Após a oxigenação, o sangue rico em oxigénio retorna à aurícula esquerda e seguidamente ao ventrículo esquerdo. O sangue é bombeado para a aorta para irrigar o resto do corpo. Se o canal arterial se ocluir normalmente não há conexão entre a aorta e a artéria pulmonar, consequentemente não haverá mistura entre os dois tipos de sangue: o oxigenado e o pobre em oxigénio.
Figura 1- Diagrama de coração normal e coração com persistência de canal arterial |
Com todas as alterações que ocorrem após o nascimento, a persistência do canal arterial vai levar a um desvio de sangue da circulação sistémica (sangue oxigenado da artéria aorta) para a circulação pulmonar (isto é, para a artéria pulmonar), levando a que o sangue flua do ventrículo esquerdo para a aorta e desta de volta para a artéria pulmonar. Este desvio grande de sangue através do canal arterial leva a um aumento da quantidade de sangue que chega aos pulmões do bebé. Este aumento de sangue nos pulmões leva, por um lado, à chamada insuficiência cardíaca e por outro lado, a uma diminuição da quantidade de sangue que chega às restantes partes do corpo, em particular ao aparelho digestivo e ao cérebro do bebé. A persistência do canal arterial é, desta forma, um factor de risco para outros problemas clínicos, tais como: neurológicos, gastrointestinais e renais, podendo ocorrer no bebé hemorragia intraventricular, paralisia cerebral, enterocolite necrosante (uma lesão na superfície interna do intestino)e a insuficiência renal. O aumento do fluxo de sangue para os pulmões pode originar edema pulmonar (aumento de líquido nos pulmões) e hemorragia (sangramento), habitualmente nos dois primeiros dias de vida, com consequente agravamento da dificuldade respiratória, aumento da necessidade de ventilação mecânica e do risco de displasia broncopulmonar (uma doença pulmonar crónica decorrente de lesões repetitivas do pulmão). A persistência de canal arterial em RN prematuros está assim associada a um aumento significativo do número de complicações e da mortalidade desta população.
Quais são os sinais e sintomas?
Os efeitos da persistência de canal arterial no RN prematuro podem ser:
- aumento do esforço respiratório secundário a congestão pulmonar - frequência respiratória (número de respirações por minuto) mais rápida, com necessidade de mais oxigénio para manter os níveis de oxigénio no sangue estáveis, dessaturações (diminuição do conteúdo de oxigénio medido no sangue), episódios de apneia (períodos de tempo sem respirar, que podem ser de 10 a 20 segundos de duração) e um agravamento das alterações pulmonares, com necessidade de ventilação mecânica para além do tempo esperado ou dificuldade em progredir para a extubação do RN.
- Aumento do trabalho do coração - frequência cardíaca mais rápida, auscultação de sopro sistólico ou contínuo, instabilidade clínica. Isso ocorre porque muito sangue flui de volta para os pulmões e depois de volta para o coração, sem suprir o resto do corpo, ou seja, uma circulação ineficaz, o que leva a que o coração tenha que trabalhar mais.
Como se diagnostica a persistência de canal arterial?
Normalmente, o único teste necessário para fazer o diagnóstico é um ecocardiograma, que é um exame indolor e não invasivo.
Que tratamento está disponível?
Nos RN pré-termo é muitas vezes necessário utilizar medidas terapêuticas de restrição hídrica (alimentar o RN com quantidades menores de leite), pode ainda precisar de alguma medicação (diuréticos) para ajudar a remover líquidos extra, produzindo mais urina. Isso ajudará a reduzir o excesso de líquido nos pulmões. Podem ainda ser necessárias outras medidas como transfusão de sangue e/ ou ventilação assistida com pressão positiva. Nos casos em que não seja possível controlar a insuficiência cardíaca utilizam-se medicamentos como o ibuprofeno. Nos casos de persistência do canal arterial mais graves e que não respondem às medidas anteriores e à medicação, o RN pode precisar de uma cirurgia para encerramento (laqueação) do canal arterial. Esta operação laqueia o canal arterial com um clipe de metal e é realizada através de um corte no lado esquerdo do tórax e o clipe é colocado em redor do canal arterial de forma a ocluí-lo.
Sérgio Matoso Laranjo
Sérgio Matoso Laranjo
segunda-feira, 12 de novembro de 2018
Sérgio Matoso Laranjo é Licenciado em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa, onde atualmente é investigador e docente em Fisiologia Humana, encontrando-se a terminar a tese de Doutoramento.
Como médico, é especialista em Cardiologia Pediátrica no Hospital de Santa Marta, no Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central, tendo como área de interesse o estudo das arritmias cardíacas em crianças, resposta ao exercício físico e prevenção de morte súbita. É autor de vários capítulos de livros e publicações em revistas indexadas na área da cardiologia pediátrica, fisiologia e sistema nervoso autónomo.
Alimentação e fertilidade
sexta-feira, 9 de novembro de 2018
A infertilidade, definida pela incapacidade em engravidar após um ano de relações sexuais sem qualquer método contracetivo, é um problema que afeta cerca de 186 milhões de pessoas a nível mundial. Em Portugal, estima-se que cerca de 15 a 20% dos casais em idade reprodutiva sofram deste problema.
Como vimos no último artigo desta rubrica (que pode consultar aqui), a alimentação e a nutrição desempenham um papel central na saúde materna e fetal. Contudo, pode ser também determinante para a própria conceção, ao otimizar a fertilidade do casal e, assim, aumentar as probabilidades de conceber um filho há muito desejado!
Vejamos então como é que a alimentação pode ajudar a este nível.
Começando pelo micronutriente mais abordado na gravidez, também aqui tem um papel de destaque. Segundo a literatura científica, a suplementação com ácido fólico num período prévio à gravidez parece não só prevenir malformações no feto (como vimos no último artigo), como também aumentar a probabilidade de conceção e manutenção da gravidez. Contudo, este benefício surge em doses superiores às recomendadas atualmente para evitar o surgimento de complicações no feto (400mcg), não estando ainda definida uma dosagem exata que assegure este efeito.
No que respeita às gorduras, uma associação entre um elevado consumo de ácidos gordos poli-insaturados, maioritariamente dos ácidos gordos ómega 3 e um baixo consumo de ácidos gordos trans apresenta também um impacto positivo na fertilidade feminina. Desta forma, reforça-se uma vez mais, a importância do consumo de peixe gordo, não só na gravidez como também num período pré-concecional, não esquecendo a importância de evitar peixes com elevado teor de metilmercúrio, em ambas as fases.
No caso dos hidratos de carbono, a ovulação parece ser potenciada quando se restringe a sua ingestão, mas este efeito apenas se verificou em mulheres com Síndrome do Ovário Poliquístico.
No caso particular do sexo masculino, o cálcio desempenha um importante papel pelo seu efeito positivo na mobilidade dos espermatozóides e na sua penetração no oócito. Para além disto, também a suplementação com antioxidantes nos homens parece ser benéfica, não estando contudo esclarecidos os tipos de antioxidantes e as quantidades ótimas para potenciar este efeito.
Existem ainda evidências claras de que o consumo de ácidos gordos saturados e trans, presentes por exemplo na carne vermelha e nos produtos de pastelaria, prejudicam a fertilidade masculina. À semelhança daquilo que acontece no sexo feminino, os ácidos gordos ómega 3 parecem ter também aqui um efeito positivo.
Já o tabaco surge, uma vez mais, como vilão, desta vez por prejudicar a qualidade e quantidade do sémen.
De um ponto de vista mais global, a adesão a padrões alimentares saudáveis, como é o caso da Dieta Mediterrânica, tem sido associada a uma melhoria da fertilidade feminina e qualidade do sémen. Um aumento do consumo de peixe e frutos gordos, azeite, hortofrutícolas e cereais integrais em detrimento das carnes vermelhas e produtos processados, constitui uma mais-valia neste processo, para além do benefício que apresenta em muitos outros parâmetros da saúde do casal.
Também o estado nutricional, expresso pelo Índice de Massa Corporal (IMC), tem impacto a este nível, estando os extremos, quer o excesso de peso (materno e paterno), quer a magreza (materna) associados a menor probabilidade de conceção.
Como vimos, os hábitos alimentares (e tabágicos!) são determinantes também na pré-conceção. Lembre-se que ao cuidar de si está a cuidar também da sua descendência!
Vejamos então como é que a alimentação pode ajudar a este nível.
Começando pelo micronutriente mais abordado na gravidez, também aqui tem um papel de destaque. Segundo a literatura científica, a suplementação com ácido fólico num período prévio à gravidez parece não só prevenir malformações no feto (como vimos no último artigo), como também aumentar a probabilidade de conceção e manutenção da gravidez. Contudo, este benefício surge em doses superiores às recomendadas atualmente para evitar o surgimento de complicações no feto (400mcg), não estando ainda definida uma dosagem exata que assegure este efeito.
No que respeita às gorduras, uma associação entre um elevado consumo de ácidos gordos poli-insaturados, maioritariamente dos ácidos gordos ómega 3 e um baixo consumo de ácidos gordos trans apresenta também um impacto positivo na fertilidade feminina. Desta forma, reforça-se uma vez mais, a importância do consumo de peixe gordo, não só na gravidez como também num período pré-concecional, não esquecendo a importância de evitar peixes com elevado teor de metilmercúrio, em ambas as fases.
No caso dos hidratos de carbono, a ovulação parece ser potenciada quando se restringe a sua ingestão, mas este efeito apenas se verificou em mulheres com Síndrome do Ovário Poliquístico.
No caso particular do sexo masculino, o cálcio desempenha um importante papel pelo seu efeito positivo na mobilidade dos espermatozóides e na sua penetração no oócito. Para além disto, também a suplementação com antioxidantes nos homens parece ser benéfica, não estando contudo esclarecidos os tipos de antioxidantes e as quantidades ótimas para potenciar este efeito.
Existem ainda evidências claras de que o consumo de ácidos gordos saturados e trans, presentes por exemplo na carne vermelha e nos produtos de pastelaria, prejudicam a fertilidade masculina. À semelhança daquilo que acontece no sexo feminino, os ácidos gordos ómega 3 parecem ter também aqui um efeito positivo.
Já o tabaco surge, uma vez mais, como vilão, desta vez por prejudicar a qualidade e quantidade do sémen.
De um ponto de vista mais global, a adesão a padrões alimentares saudáveis, como é o caso da Dieta Mediterrânica, tem sido associada a uma melhoria da fertilidade feminina e qualidade do sémen. Um aumento do consumo de peixe e frutos gordos, azeite, hortofrutícolas e cereais integrais em detrimento das carnes vermelhas e produtos processados, constitui uma mais-valia neste processo, para além do benefício que apresenta em muitos outros parâmetros da saúde do casal.
Também o estado nutricional, expresso pelo Índice de Massa Corporal (IMC), tem impacto a este nível, estando os extremos, quer o excesso de peso (materno e paterno), quer a magreza (materna) associados a menor probabilidade de conceção.
Como vimos, os hábitos alimentares (e tabágicos!) são determinantes também na pré-conceção. Lembre-se que ao cuidar de si está a cuidar também da sua descendência!
Maria Inês Cardoso
A visão e as novas tecnologias
quarta-feira, 7 de novembro de 2018
Um dos temas em que os pais têm muitas dúvidas é sobre a utilização, pelas crianças, das novas tecnologias.
Faz mal estar muito tempo no telemóvel? E ao computador? Pode fazer mal ao desenvolvimento visula? Pode causar miopia? Qual a sua recomendação?
Mas, o que realmente muitos pais me pedem é: Dra., diga ao meu filho que ele não pode utilizar o tablet ou o telemóvel. E como posso eu dizer isto, se hoje em dias as novas tecnologias são imprescindíveis no nosso cotidiano? Por isso, não é proibir, mas saber quais os cuidados e atitudes que temos de ter com as crianças para que possam utilizar as novas tecnologias de maneira adequada.
O uso das novas fontes de tecnologia tais como o tablet, telemóveis e computador exigem a utilização prolongada da visão de perto e apesar de serem consideradas nocivas para os olhos, a evidência científica de tais efeitos é inconclusiva.
O abuso destas tecnologias provoca sinais e sintomas relacionados com o denominado Síndrome de Visão de Computador (SVC). Quando estamos muito tempo em frente às novas tecnologias, diminuímos o pestanejo e há uma maior percentagem de pestanejo incompleto com disfunção das glândulas de meibomius e, como consequência, temos uma maior evaporação da lágrima, o chamado olho seco evaporativo. Isto faz com que as crianças aumentem o pestanejo e tenham mais comichão nos olhos. Para além disso, para conseguirmos focar ao perto, utilizamos o mecanismo da acomodação em que temos que utilizar um músculo denominado músculo ciliar. E quanto mais próximo estiver o objeto dos olhos, maior é o esforço acomodativo para focar a imagem. O excesso de focar ao perto acaba por provocar as queixas de cansaço ocular tais como visão baça, dor de cabeça e visão dupla.
Uma iluminação adequada, filtros anti-reflexo, o posicionamento correto do ecrã e pausas regulares ajudam no conforto visual. A regra dos 20/ 20 recomenda que a cada 20 minutos se descanse 20 segundos, a uma distância de 20 pés (cerca de 6 metros). Algumas crianças têm a tendência de aproximar muito os aparelhos dos olhos, por isso devemos corrigir sempre a postura para que a distância de trabalho seja de cerca de 30 cm.
Relativamente à relação do excesso de uso de visão de perto com a indução de miopia, os estudos até hoje não demonstraram relação. O principal fator de risco para a miopia é ter um ou os dois pais míopes. O que alguns estudos demonstraram é que há um efeito protetor da luz solar no aumento da miopia, principalmente na infância precoce, dos 6-12 anos. Cada vez mais as crianças deixam de brincar ao ar livre para brincar com o tablet, computador e ver televisão. E para além da criança não estar tanto tempo ao ar livre, ela simultaneamente também deixa de brincar com outras crianças e, por isso, acaba por ter alterações do desenvolvimento e de competências sociais. Assim, o passar mais tempo ao ar livre a brincar é benéfico não só para a saúde ocular, mas também para o seu desenvolvimento pessoal.
A Academia Americana de Pediatria e a Sociedade Canadense de Pediatria recomendam, atualmente, que a utilização das novas plataformas de tecnologia (não só para a saúde visual, mas para o desenvolvimento psicossocial da criança), não passe de uma hora por dia nas crianças entre os 3 e os 5 anos e não mais de duas horas por dia, nas crianças entre os 6 e os 18 anos. Ante dos 2 anos de idade, sugerem que as crianças não devem ter contacto com as novas tecnologias.
Assim, a minha recomendação é que as crianças brinquem regularmente ao ar livre, sempre que possível na companhia da família e de outras crianças e que, quando usarem os aparelhos supracitados, não ultrapassem as horas recomendadas pelos especialistas, sempre com a distância de trabalho adequada.
Lígia Figueiredo
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