"Sofia, quando saí do consultório, o meu corpo estava ali com o meu filho e o meu marido, mas a minha mente estava a mil, querendo fugir dali..."

Este testemunho é exemplo do que eu vivo com os "meus" pais. Ao longo dos últimos anos, tenho acompanhado famílias que recebem o diagnóstico de Perturbação do Espetro do Autismo. Tento estar ao lado deles desde o início, daí conseguir compilar algumas estratégias e orientações que nos ajudaram a desenvolver um trabalho em conjunto.


Passo a mencionar oito passos que não devem ser aplicados sem a consulta ou aprovação do técnico que vos acompanha:
  • Encontre rapidamente uma fonte segura de informação
No consultório, muitas vezes, acenam a cabeça como se concordassem com o que o médico está a dizer, mas mal entram no carro, as dúvidas começam a surgir. "Não terá sido algo que fiz na gravidez? Como vai ser o desenvolvimento? Vai falar? Mas o que é mesmo esta perturbação?"

A forma mais rápida de obter respostas: internet!

Estaria a ser rígida convosco se dissesse para não o fazerem. Entendo a ansiedade de querer satisfazer as vossas dúvidas. No entanto, o conhecimento é poder quando é bem fundamentado e filtrado. 

Por isso, procurem sempre sites com credenciais fidedignas e intervenções que sejam "evidence-based", ou deja, intervenções que já foram estudadas e exploradas em diversos ambientes e culturas - isso fará com que a vossa pesquisa reduza de 2500 tratamentos, para 100 possíveis tratamentos para o autismo. 

Qualquer dúvida, novidades ou notícias sobre um tema exponham ao vosso técnico. Ele terá de averiguar se a fonte é segura e se existem artigos científicos que apoiem essa matéria. Por favor, nunca tenham vergonha de fazer perguntas. 

  • Rodeiem-se de profissionais especializados
Abordo este tema porque, por vezes, o médico sugere uma equipa ou um técnico com quem trabalha regularmente. Quando conseguem alguém que trabalhe com o vosso filho, tentem perceber se ele irá ajudar, respondendo às vossas perguntas ou receios. 

Por vezes, o profissional recomendado pode ser tecnicamente muito bom, mas a nível de relação interpessoal parece não ter havido um "click". Nunca se sentirão confortáveis com ele. Por isso, peçam ao vosso médico mais contactos ou procurem alguém com quem possam trabalhar e manter uma relação estável. 

Mas se não tem essa possibilidade, poderão inscrever-se no Sistema Nacional de Intervenção Precoce, através de equipas de intervenção precoce locais. É um apoio público que visa ajudar-vos com o diagnóstico, acompanhamento terapêutico e percurso escolar.


  • Valorizem o vosso papel na dinâmica terapêutica
Devido a ser uma intervenção precoce, estamos a atuar num cérebro que ainda está em desenvolvimento, sendo comum falarmos de neuroplasticidade - a capacidade do cérebro de se moldar e adquirir novos comportamentos e competências, abrindo assim uma janela para novos começos. 

Nós precisamos da vossa ajuda - sim, é fundamental! - por isso, peçam aos vossos técnicos que vos ensinem o básico. Mesmo que não façam na perfeição, não se preocupem, estão a dar o vosso melhor!

  • Aproveitem todas as oportunidades
Escrevam numa folha as vossas rotinas e as brincadeiras preferidas do vosso pequenote. Irá ajudar a terem uma visão geral das atividades do vosso dia-a-dia (refeições, banhos, brincadeiras a sós, escola, ama ou jardim de infância.

Ao analisarem o vosso dia, tentem perceber quando o vosso filho está mais desperto e atento ou mais cansado. Assim, distribuam o tempo a sós pelo dia. Por exemplo, em de brincarem uma hora inteira com ele (pode ser frustrante para todos), podem dividir em períodos de  minutos: podendo ser no banho, nas refeições, mudar a fralda ou com brinquedos. 


  • Removam os "distratores" (brinquedos, tablets e televisões)
Nestes momentos em que estão frente a frente e sozinhos, controlem o ambiente que vos rodeia. Quantos mais distratores tiverem à vossa volta, mais difícil será captar a atenção do vosso filho. Assim, terão mais oportunidades de criar contacto visual e pedidos.


  • Comecem com pequenos jogos
Podem experimentar, por exemplo, imitar as ações ou as brincadeiras dos vossos filhos. 

Enquanto brincam, tentem recriar o que ele está a fazer, isso provavelmente suscitará a atenção dele. Ou, por exemplo, criem brincadeiras que possam envolver. Algumas sugestões: colocar uma manta no chão e puxar como se fosse um comboio; bolinhas de sabão; bolinhas saltitonas; creme de barbear num tabuleiro; plasticina; puzzles ou brinquedos sensoriais. 

Dêem sempre a primeira viagem grátis, ou seja, explorem um bocadinho a brincadeira. Se ele estiver a gostar, parem e esperem que ele olhe e venha ter convosco. Assim que isso acontecer, continuem a brincar. Façam sempre tudo com entusiasmo, festejando cada pequena conquista. Quando conseguem a atenção dos vossos filhotes e percebem que conseguiram interagir digam mesmo "Uaaaauuuu!! Que lindo!"

  • Comportamentos negativos e estereotipias 
Infelizmente para estes campos, cada criança é única. Terão de analisar com o vosso terapeuta o que fazer. Ou seja, cada um de nós comporta-se de maneira diferente face à mesma situação, por isso, é preciso ser estudado e analisado em cada criança. Entender o porquê, onde, quando e o que é que aconteceu para este comportamento estar a acontecer. Após essa análise, perceber se é funcional e se há alguma estratégia a aplicar.


  • Por último, tomem conta de vós
Eu sei! Não é fácil! Têm imenso com que lidar, mas ajudem-se a vós próprios. Quando não estão bem, todos à vossa volta sofrem. Pensem: um dia de cada vez. Haverá dias difíceis e dias maravilhosos. Valorizem todos os momentos. 


Sofia Rocha-Bernardino