Quando nascemos somos portadores de cerca de 20 mil células ciliadas que vamos perdendo ao longo da vida, pelo processo natural de envelhecimento. Estas células localizam-se na cóclea e funcionam como amplificadores dos sons que recebemos, transformando-os em mensagens nervosas que são transmitidas ao cérebro. 

O ruído é um som considerado desagradável ou incómodo ao indivíduo. Expressa-se em decibéis (dB) que é a unidade utilizada para medir a intensidade do som. 

Quando o ouvido humano se encontra exposto a sons ruidosos, as células da cóclea necessitam de um elevado nível de energia para fazer frente a essa situação, energia essa de que não despendem habitualmente. Isto conduz a uma perda de rigidez das células, iniciando-se um processo de destruição das mesmas. Este é o primeiro passo para o condicionamento da função e consequentemente para a perda auditiva. 




A perda auditiva induzida por ruído (ou PAIR) é a segunda causa mais comum de perda neurossensorial e pode ocorrer tanto a nível ocupacional, como a nível recreativo. 

O ruído está presente no nosso dia-a-dia! E se frequentar uma discoteca ou ir a um concerto constituem opções individuais, conviver com o ruído não o deve ser! Situações tão comuns como o tráfego rodoviário, a descolagem de um avião ou a frenagem de um comboio na chegada à estação constituem ruídos de intensidades capazes de ferir, a longo prazo, o ouvido interno e as suas células. Da mesma forma, são inúmeros os ofícios que ocasionam exposição ao ruído intenso ao longo da vida profissional. 


A exposição ao ruído pode ser considerada excessiva consoante a intensidade, a duração e a frequência do estímulo a que a pessoa esteja sujeita e pode resultar numa perda auditiva temporária (ou permanente), associada ou não a acufenos (zumbidos), bem como a queixas de hiperacusia (perceção auditiva elevada que pode provocar dor). 



A perda auditiva temporária (TTS) consiste numa diminuição temporária da acuidade auditiva resultante da exposição a sons intensos. E pode subsistir entre 24 a 48h até ser atingida a recuperação total. 

Se a exposição ao som intenso for mais prolongada pode originar uma perda auditiva permanente (PTS), provocando uma alteração permanente no limiar auditivo e a destruição irreversível das células ciliadas da cóclea. 

Esta perda é neurossensorial (irreversível) e quase sempre bilateral e simétrica. Verifica-se, em primeiro lugar, ao nível das células ciliadas externas do ouvido interno, responsáveis pelos sons de alta frequência (3-6kHz) - o que altera a receção de fonemas e o reconhecimento do discurso. 

Raramente evolui para uma perda profunda e assim que a exposição sonora termine, deixa de haver progressão. Por norma, o ruído contínuo é mais lesivo que o ruído intermitente. 

Os acufenos são outro sintoma associado à exposição a ruídos intensos. Acufeno (ou zumbido) é a perceção de um som, no ouvido ou na cabeça, sem que exista um estímulo externo. Os acufenos induzidos por ruído aumentam com a idade e podem desencadear também distúrbios do sono, depressão, diminuição da capacidade de concentração e comunicação, baixa auto-estima ou estigmatização social.

Para além destes sintomas, algumas pessoas referem ainda hiperacúsia - condição caracterizada por uma maior sensibilidade a certas frequências e volumes de som.

Importa salientar que os efeitos da exposição sonora são cumulativos e por essa razão nem sempre são detetados nos exames audiológicos iniciais.




POPULAÇÃO ESPECIAL: CRIANÇAS E JOVENS

10 a 20% da perda auditiva induzida pelo ruído corresponde à população das crianças e adolescentes. Por ser um público mais vulnerável - nem sempre podem escapar a uma exposição ao ruído ou não estão conscientes dos seus potenciais riscos - é ainda mais preocupante do que nos adultos.

Estudos revelam que, apesar de alguns jovens já terem experienciado sintomas decorrentes de uma exposição a sons excessivos, este facto nem sempre é revelado por não considerarem a perda auditiva uma preocupação.

A exposição ao ruído por parte desta população pode provocar, para além dos sintomas já descritos, alterações ao nível do desenvolvimento, tais como irritabilidade, desempenho cognitivo e distúrbios do sono.


Mp3, iPods e outros leitores de música pessoais: são considerados os grandes responsáveis pela perda auditiva na população mais jovem. Na maioria destes equipamentos, o volume de som oscila entre os 60 e os 120 dB.

94% da população jovem utiliza, hoje em dia, estes dispositivos para ouvir música, sendo que 30% o fazem em volumes exageradamente elevados (principalmente se existir ruído de fundo).

O facto da qualidade de som não se deteriorar em níveis de volume elevados e a autonomia e a capacidade de armazenagem serem cada vez maiores, conduz a tempos de reprodução mais longos. Além disso e ao contrário do que é recomendado, a maioria dos jovens não utilizam os auscultadores fornecidos por estes equipamentos - o que agrava fortemente o impacto.

Os dispositivos mais recentes já dispõem, todavia, de um mecanismo de regulação de volume por forma a limitar os níveis sonoros de saída.


Discoteca: as discotecas consitituem outra fonte sonora, ao nível do entretenimento, onde os jovens potencialmente correm mais riscos de lesões auditivas. Nestes locais, para além do volume sonoro, existe uma forte limitação na dispersão do som (por serem locais normalmente pequenos), assim como a ausência de espaços que permitam um período de descanso ao ruído.

Outra questão recorrente nestes espaços é a frequente necessidade dos jovens em se aproximarem das zonas de saída do som ("em cima" das colunas) - o que agrava o trauma pela proximidade à fonte sonora.


Cinema/ Concertos/ Eventos desportivos: efeitos muito semelhantes aos das discotecas pelo grande aglomerado de pessoas e efeitos sonoros. Poderemos, contudo, beneficiar de zonas mais espaçosas e ambientes ao ar livre que facilitem a dispersão do som. Nestas situações podem atingir-se 100 a 110 dB.

Os jovens de sexo masculino estão mais expostos a estes comportamentos de risco em virtude da sua apetência por maior quantidade de atividades de lazer.


Outras causas: os brinquedos para crianças são fontes de ruído mais recentemente reconhecidas e das quais não se esperaria uma preponderância tão grande naquilo que é a perda auditiva.

O ruído das incubadoras e das unidades de cuidados intensivos neonatais podem também atingir níveis potencialmente cocleotóxicos, condicionando prematuros ou grandes prematuros durante o normal desenvolvimento e maturação do seu sistema auditivo. Ainda assim e principalmente neste último caso, deve ponderar-se a relação prejuízo/ benefício.



FORMAS DE PREVENÇÃO:

  • Evitando exposições prolongadas a sons intensos/ limitando a utilização diária de dispositivos com volumes excessivos;
  • Utilizando protetores auriculares (em concertos, festivais, discotecas, mas também em profissões que incluam exposição a sons traumáticos);
  • Educação a nível escolar - falando da perda auditiva nas escolas através de campanhas de sensibilização e introduzindo exames auditivos anuais nas escolas;
  • Melhorando hábitos alimentares - impacto benéfico ao nível da circulação sanguínea (redução do colesterol e prevenção de diabetes) e consequentemente na irrigação do ouvido interno;
  • Escolhendo corretamente os auscultadores. 

Como escolher auscultadores seguros? (Listen: the World of Widex.2014)


  1. Conforto - é possível que passe muito tempo com eles e ao ter a certeza de que servem confortavelmente, vai também reduzir a necessidade de volumes excessivos devido a um selo acústico pobre;
  2. Qualidade de áudio - quanto melhor for a qualidade de áudio mais irá gostar deles. Também não vai precisar de aumentar o volume para ouvir detalhes;
  3. Utilização prevista - certifique-se que os auscultadores são bons para o uso que lhes pretende dar - desporto, música ou jogos. 




A perda auditiva, induzida pelo ruído, é 100% prevenível! 


Inês Martins