A música é uma das maiores dádivas da humanidade, um dos nossos maiores legados, património da nossa existência enquanto seres vivos dotados de inteligência, sensibilidade e intuição. 

Para um ser em desenvolvimento, a música é fundamental, por emitir uma vibração própria. Ao ser tocado um instrumento, o som repercute-se no nosso corpo, expandindo a nossa consciência, o corpo físico estende-se e prolonga-se para além dos limites fisionómicos do próprio ser

O trabalho de aperfeiçoamento de uma pequena frase melódica, de um timbre, de uma nota, de um crescendo, exige um foco imediato, uma entrega, aumentando o nível de concentração. 


A música leva-nos a descobrir e a percorrer o nosso mundo interior e a propagarmo-nos (ao nosso campo de consciência) existencialmente.  Aquando da primeira vez ao tocar a minha primeira guitarra clássica, senti a vibração das cordas no corpo, tocou-me o coração. Noites em que a guitarra dormiu ao meu lado. Conheço-a profundamente, cada som, cada timbre, cada espaço, cada corda, cada ruído, numa extensão do meu próprio corpo e consciência para além de mim mesmo. 

Pensadores antigos ligavam cada nota musical a um planeta do Sistema Solar, o nosso corpo vibrando e ressoando com o Universo. A música é uma terapia em si, de coordenação, de harmonização do próprio corpo, ponte de vibração entre o próprio corpo e um espaço exterior a nós. 


No desenvolvimento da criança, tocar um instrumento musical vai impulsionar o cérebro na utilização de ligações diferentes, através da criatividade, mecanismos menos racionais, mais intuitivos e criativos (aqui vários níveis podem ser verificados, consoante o Professor oriente o trabalho de cada aluno e a própria resposta deste). 

Na minha opinião enquanto Professor, Músico e Compositor, em cada aluno deve-se procurar um sentido criativo existencial na música. Improvisar um pequeno trecho com o Professor a acompanhar e estimular o estudante na criação de um pequeno trecho musical ou pequena peça de sua autoria são fundamentais. O trabalho de ler partituras, tocar e interpretar pode ganhar mais sentido e dimensão com os exercícios anteriores. 

Num mundo onde a tecnologia domina todas as áreas, urge compensar com um trabalho "artesanal". O "artesão", quer seja criança ou adulto vibra e busca o som em harmonia com o que o rodeia, o seu corpo propaga-se para além da sua matéria física, ressoando no universo criativo e circundante. No meu caso e usando a postura clássica tradicional, a guitarra fica colocada junto ao peito. Na minha forma de sentir e analisar, projeta-se na linha e linguagem do coração, harmonizando a linguagem e aprendizagem racional, que representam a maioria do trabalho desenvolvido na Escola: enquanto estudante, sempre senti falta de uma aprendizagem e abordagem geral mais criativas. A música pode e deve colmatar essa lacuna de base do ensino. 



Não podia descrever melhor do que Nietzsche: A Vida sem Música seria um erro.


Vasco Abranches 
(Texto e Fotografias)