Dizer adeus...
A morte de um bebé a seguir ao parto ou após algum tempo internado numa unidade neonatal (por prematuridade ou outra situação clínica) traz uma dor emocional profunda, muito mais duradoura do que o que se poderia imaginar. Não "dói" menos do que a morte de um filho numa idade mais tardia. A exigência do internamento, que confronta os pais com a angústia de uma morte antecipada, as poucas (ou nenhumas) memórias e experiências partilhadas, a impossibilidade de o poderem pegar ao colo, mimar, proteger, leva a que o processo de luto se desenvolva de uma forma mais complexa, em relação a um bebé que foi real, mas que continua a fazer parte do imaginário.
Maior será a dificuldade quando se trata de um nascimento gemelar ou trigemelar, em que apenas um dos gémeos morre. Aqui a vida e a morte estão lado a lado, dificultando uma despedida, porque se tem em simultâneo de canalizar toda a energia na esperança e na vida do(s) bebé(s) que se encontra(m) vivo(s).
Difícil também para os pais sentir que a sociedade, por vezes, não compreende o impacto da perda de um bebé, poucas horas ou semanas a seguir ao parto. Expressões como "era muito pequenino... se calhar foi melhor assim"... "se fosse mais tarde seria pior"... "logo voltam a engravidar", custam a ouvir, deixando os pais cada vez mais isolados na sua dor.
Por isso... não existem palavras para descrever a dor e devastação causada pela perda de um bebé. Sair do hospital com os braços vazios, chegar a casa e olhar para um quarto que já não pode ser vivido e festejado, representa para os Pais a perda de um futuro, dos seus sonhos e esperanças. Não só do bebé que se perdeu, mas também de outras perdas com enorme significado: de um projeto e de um sentido para a vida, a perda da maternidade/ paternidade e perda de autoestima.
Não se pode mudar a perda. A morte, que priva os Pais do seu bebé, não volta para trás. É necessário continuar por um caminho que é complexo e difícil para, aos poucos, se reaprender a viver com a ausência e a descobrir novos significados para a vida.
O caminho do luto
O modo como os Pais reagem à perda é único e individual e depende de vários fatores: da personalidade, da sua história de vida, culturais, religiosos e mesmo espirituais. Contudo, o desequilíbrio que resulta da perda leva-os a experienciar uma série de alterações de vida/ psicológicas após a morte do bebé, das quais não estavam à espera. Não há forma de as evitar e a sua vivência é necessária, fazendo parte de um processo dinâmico, longo, por vezes não muito claro, mas necessário para se curar a ferida.
- O que os Pais podem sentir
No início a maioria dos Pais podem sentir-se em choque e entorpecidos, especialmente nos primeiros dias após a morte do seu bebé. Vive-se uma espécie de pesadelo, de distanciamento emocional, onde é difícil entender e compreender o que se passa à sua volta. Podem reagir como uma espécie de "robots", tratando das várias tarefas que têm que ser feitas nessa altura: telefonar para a Família e amigos, organizar o funeral e as rotinas burocráticas.
As reações físicas acompanham a vivência emocional. Podem sentir palpitações ou dores no peito, um nó no peito que sufoca e não deixa respirar, sentirem-se agitados, confusos e desorientados. Se o bebé teve um longo internamento, é natural que se sintam ainda mais esgotados física e emocionalmente.
Depois os sentimentos afloram à superfície e é normal experienciarem tempos de grande angústia e tristeza. Podem chorar, mesmo quando não estão à espera, às vezes mesmo durante o sono. Podem sentir-se zangados, injustiçados com a vida, revoltados e procurarem o isolamento. Podem ainda sentir que perderam a confiança e a autoestima, que dececionaram o bebé, o(a) companheiro(a) e a Família. As Mães em particular podem sentir-se culpadas e responsabilizar-se pela morte do seu bebé.
Os Pais têm o direito a sentir e expressar estas emoções. É um período intenso, mas necessário, pois não há forma de ultrapassar dado que a dor tem de sair. A dor vai e vem... vai e vem, sendo normal haver períodos de calma e normalidade e outros de tristeza. É importante que ela possa ser partilhada, sentida e expressa, para que depois a perda possa ser integrada.
A perda de um bebé cria imenso stress no casal. Pode ser muito difícil neste período apoiarem-se e compreenderem as reações e comportamento do outro. A perda e o luto que está a ser vivido influencia a capacidade das pessoas para lidar com todos os aspetos da vida diária. Torna-se difícil apoiar alguém quando se precisa também de ser apoiado.
Por fim, nesta caminhada acidentada, entre recuos e avanços, é possível integrar emocionalmente a perda e seguir em frente com as tarefas do viver. É possível redescobrir um novo sentido para a vida, novos significados, novas formas de olhar e estar. É esquecida? Não, apenas guardada num lugar especial. Às vezes, um aniversário, um evento familiar, um programa da TV... faz emergir um resquício de tristeza. É normal que possa aparecer em alguns momentos, para depois ser guardada com carinho nesse lugar especial. Muitos Pais dizem que a vida mudou, mas que se pode continuar a funcionar e descobrir um novo sentido para a vida.
O Luto pela perda de um bebé é uma caminhada longa, que provoca nos Pais uma dor intensa e complexa. A sua dimensão trágica e "fora do tempo" ameaça os Pais na sua função de parentalidade e no seu projeto de vida. É necessário aceitar a realidade da perda, experienciar a dor, para que depois possam seguir em frente e sejam capazes de continuar.
Não há forma de fugir a esta inevitabilidade. As emoções são guias que orientam no sentido da recuperação e na reconstrução de um novo equilíbrio. Quando estas emoções são inibidas, se são tão intensas que incapacitam, ou se encontram deslocadas para outras formas de mal-estar, significa que os Pias não estão a fazer adequadamente o luto da sua perda. Este pode tornar-se crónico, com consequências a nível individual (depressão e ansiedade), conjugal e na qualidade de vida em geral.
Algumas sugestões podem ajudar nesta caminhada:
- Vivam um dia de cada vez, sem exigirem demais de vós;
- Retirem tempo para se recuperarem emocional e fisicamente antes de tomarem decisões;
- Não se sintam pressionados pela Família e amigos a "seguirem em frente";
- Criar memórias e lembranças pode também ajudá-los a compreender o que significa a perda do vosso bebé;
- Se existirem outros filhos, não tenham medo de lhes explicar o que se passou e porque se sentem tristes. Eles ficam mais assustados e confusos quando são deixados de parte;
- Criem rotinas e atividades dentro daquilo que é possível;
- Procurem ajuda psicológica especializada quando a dor é incapacitante e não permite seguir em frente.
Lília Brito
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