A fala é a forma de comunicação mais acessível para interagir com o mundo que nos rodeia. No entanto, é um processo complexo que não é imediato, necessitando de equilíbrio muscular e estrutural de todo o nosso sistema estomatognático para ocorrer sem alteração. 

Assim, é um processo que requer treino e um bom desenvolvimento de várias estruturas (boca, lábios, dentes, bochechas, palato (céu da boca), língua, mandíbula e maxila e músculos da face) que são comuns a várias funções: sucção, deglutição, mastigação, fala e respiração. 

A primeira função inicia-se e desenvolve-se de forma reflexa ainda dentro da barriga da mãe quando o bebé começa a desenvolver a sucção (por volta do 5º mês de vida intra-uterina, sendo observado a partir da 29ª semana e estando completamente desenvolvida por volta da 32ª semana). 

Após o nascimento, é através da sucção que a criança se alimenta (quer seja na mama ou por tetina) e a mesma permite o crescimento da face, do maxilar inferior e adequa o movimento, o tónus e a força da língua, dos lábios, das bochechas e do palato. Prepara também os músculos da face e as estruturas da cavidade oral para quando chegar a altura do bebé começar a comer as primeiras refeições com a colher, a beber líquidos pelo copo e a mastigar alimentos mais duros, garantindo assim uma adequada transição alimentar.

A sucção representa então um papel importante no desenvolvimento orofacial, que irá por sua vez reflectir-se na produção de fala, uma vez que os músculos e estruturas que a criança usa para sugar serão os mesmos que usará para articular os sons da fala. 

No recém-nascido a alimentação é feita através da ingestão de leite, obtendo-o através da sucção nutritiva na mama ou no biberão. A Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda o aleitamento materno exclusivo até aos 6 meses e, após esse período, até aos dois anos ou mais, em conjunto com alimentos complementares como sendo a forma ótima de nutrição do recém-nascido. 

As vantagens do leite materno incluem não só o seu conteúdo nutricional, como também a melhor capacidade de absorção interna dos seus nutrientes, prevenção de alergias, problemas respiratórios e outras doenças, desenvolvimento psicológico mais favorável, melhores defesas imunológicas, exercendo igualmente um papel importante na redução da mortalidade infantil e nos aspetos afetivos entre a mãe e o bebé. 

A prática do aleitamento materno, com a adaptação à mama, promove não só melhor involução uterina (quando o útero volta ao seu tamanho normal) no período pós-parto, como diminui a incidência do cancro mamário e uterino e revela-se de grande valor prático na sua utilização, não resultando em gastos financeiros acrescidos para a família. 

Para além dos benefícios acima descritos, a amamentação através do exercício muscular assegura a qualidade do crescimento e desenvolvimento craniofacial, quer seja nos apetos ósseos, como também musculares e funcionais. 

O bebé, quando amamentado, executa cerca de 2000 a 3500 movimentos de mandíbula em 24h, enquanto quando a alimentação é feita através de tetina, esses movimentos são de apenas cerca de 1500 a 2000. 

No nascimento, a mandíbula do bebé é pequena e apresenta uma posição um pouco recuada em relação à maxila e a sucção na mama promove o desenvolvimento adequado da mesma. Para que o bebé consiga retirar o leite da mama tem que criar dentro da cavidade oral uma pressão negativa suficiente que provoque a progressão do leite dos ductos mamários existentes no mamilo, para a sua boca. Para que tal aconteça, o bebé pressiona o mamilo contra o palato e a mandíbula movimenta-se dorsalmente para a frente e para trás e de cima para baixo. A repetição continuada destes movimentos da mandíbula ao longo da mamada, várias vezes por dia, promovem não só uma posição adequada para a erupção dos dentes decíduos (dentes de leite), prevenindo assum futuras alterações das arcadas dentárias, mas também ativam músculos que no futuro irão participar ativamente na mastigação. 

Desta forma, o crescimento adequado da mandíbula irá permitir que a língua tenha maior amplitude de movimentos, sendo estes necessários para a mastigação correta dos alimentos, no futuro.

Além disso, promove também uma relação adequada entre as estruturas duras e moles do aparelho estomatognático, permitindo não só a tonicidade e postura correta da língua, como também um adequado vedamento dos lábios, propiciando o estabelecimento da respiração nasal. 

Contudo, o aleitamento materno na mama nem sempre é possível. Isto pode ocorrer por várias razões, tais como: alterações do mamilo/ mama da mãe, produção insuficiente de leite, exigências da vida profissional das mães que as leva a estar ausentes durante as horas de alimentação dos filhos e/ ou até mesmo a decisão da mãe de não amamentar. Quando isto ocorre, a criança começa desde cedo a usar o biberão, o que poderá promover futuramente o aparecimento de alterações ao nível do sistema estomatognático e, consequentemente, como vimos acima, alterações quer ao nível da sucção, deglutição, respiração, mastigação e fala, uma vez que estas se relacionam e dependem intimamente uma das outras. 

Da mesma forma, uma criança que utilize de forma frequente a chupeta ou tenha o hábito de sucção digital (chuchar no dedo), principalmente após os 3 anos, tem maior probabilidade de vir a ter alterações nas estruturas orofaciais que poderão conduzir ao aparecimento de alterações na fala. Isto acontece porque o uso prolongado de chupeta ou a presença de sucção digital conduz a alterações na postura dos lábios e da língua, prejudica o tónus dos músculos orofaciais, induz a ocorrência de padrões de movimentos incorretos durante a deglutição e/ ou mastigação, alterando as arcadas dentárias e promovendo a respiração oral e, consequentemente, prejudicando a emissão correta dos sons da fala e, claro, a comunicação.

A relação entre forma de aleitamento e hábitos de sucção não nutritivos tem sido descrita por vários autores, sendo que os mesmos descrevem que os hábitos orais nocivos se instalam com maior frequência em crianças que não tiveram amamentação natural, uma vez que o impulso neuronal para a sucção está presente desde a vida intra-uterina e é normal na criança, garantindo a sua sobrevivência. O aleitamento natural, para além de alimentar o bebé, também satisfaz a sucção, devido à ação dos músculos exercidos durante a mamada.

Quando a criança é alimentada através do biberão, o fluxo de leite é maior que na amamentação e, portanto, a criança fica saciada em menos tempo e com menos esforço. O prazer emocional em relação à sucção não é atingido e por isso a criança procura substitutos como o dedo, a chupeta e/ ou outros objetos para satisfazer o seu impulso para a sucção.

As alterações provocadas no sistema estomatognático pelos hábitos orais nocivos dependem da frequência, intensidade e duração do hábito.

Desta forma, tal como já foi dito anteriormente, todo o hábito que se prolongar após os 3 anos ou tiver alta frequência poderá provocar mais alterações ao nível das estruturas, tanto do ponto de vista anatómico como funcional.


Joana Fortunato