A Organização Mundial de Saúde (OMS) refere que existem vários estudos realizados nos últimos anos, que demonstram que uma parte substancial dos problemas de saúde está relacionada com a inatividade física, estimando-se que, no mundo inteiro, 1,9 milhões de mortes lhe estejam associadas. Optar por um estilo de vida dotado de comportamentos de risco para a saúde cardiovascular, como o excesso de sedentarismo, está associado a um elevado registo de casos de morbilidade e mortalidade. A inatividade física é considerada como a quarta principal causa de morte a nível mundial.


Infelizmente, e com potenciais consequências para a saúde pública a curto e a longo prazo, uma grande proporção de crianças portuguesas apresenta níveis insuficientes de atividade física, sendo que a atividade física dos rapazes e raparigas decresce com a idade cronológica. Há cerca de uma década, Portugal detinha também a maior percentagem de sedentarismo em adultos na União Europeia, ou seja, 87,8%. Segundo o Ministério da Saúde, esta tendência para a inatividade física conduz a uma série de problemas, tais como a hipertensão, diabetes, alguns tipos de cancro, problemas cardiovasculares, problemas respiratórios, distúrbios do sono, alterações osteoarticulares, alterações metabólicas e psicológicas, entre outros.

Uma das potenciais consequências da inatividade física durante a infância é o risco de excesso de peso ou obesidade. A obesidade não é só considerada uma doença de proporções epidémicas com uma crescente prevalência mundial, como apresenta uma etiologia que é multidimensional por natureza, tendo sido considerada como a epidemia do século XXI. A prevalência de crianças e adolescentes com excesso de peso e obesidade tem vindo a aumentar significativamente nos últimos anos, com repercussões significativas sobre a saúde, vindo a reduzir a sua qualidade de vida. Segundo a OMS, 20% das crianças e adolescentes na Europa têm excesso de peso e 7% são obesas. Estima-se que, em todo o mundo, cerca de 155 milhões de crianças em idade escolar apresentam excesso de peso (pré-obesidade e obesidade), das quais 30 a 45 milhões são obesas, correspondendo a 3% das crianças entre os 5 e os 17 anos a nível mundial. Portugal e Espanha não ficam de fora destes números.

Adicionalmente, o desconforto e a dor causados nas estruturas músculo-esqueléticas e na funcionalidade dos membros inferiores poderá limitar a atividade física e a prática de exercício, perpetuando o ciclo da obesidade. Em suma, a exposição adequada a cargas biomecânicas resultantes da atividade física não só é essencial para a saúde óssea como tem efeitos positivos para o desenvolvimento da criança e do adulto. Por outro lado, os seus efeitos negativos poderão estar relacionados com a exposição insuficiente à carga mecânica ou pelo excesso, podendo resultar em desequilíbrios posturais, desconforto e lesões.


Atendendo às evidências existentes relativamente ao papel da atividade física e do exercício/ desporto na saúde e desenvolvimento da criança, bem como as suas consequências na vida adulta, torna-se imprescindível promover hábitos e comportamentos saudáveis, incluindo a alimentação e o sono, a par da aquisição de estilos de vida ativos. Assumindo-se que as crianças passam a maior parte do seu tempo na escola, é aqui que deve existir uma intervenção precoce dos professores de educação física, dos fisiologistas do exercício, dos técnicos de exercício físico e dos treinadores de desporto, sendo fundamental o envolvimento da Família. No entanto, a aquisição de comportamentos ativos e saudáveis tem de se iniciar antes da entrada formal na escola.


Considerando o tempo que as crianças passam na escola é provavelmente o ambiente escolar que promove uma das influências mais importantes no comportamento de prática de atividade física das crianças, a par do contexto familiar. Neste sentido, deve a escola ser promotora de programas integradores e estruturados que por um lado permitam à criança a vivência de experiências agradáveis, ao nível da prática de atividades físicas, mas que por outro lado permitam o seu desenvolvimento cognitivo, físico e motor, de forma harmoniosa.

Não obstante, a promoção de prática de atividade física não deve ficar apenas confinada às aulas de educação física. Deve também expandir-se para o recreio escolar, para as atividades desportivas extra-escolares e principalmente para os tempos livres das crianças. Há indícios preocupantes de que as crianças apresentam, atualmente, menores níveis de atividade física como consequência da generalização dos meios de transporte e da forte atração que revelam por atividades mais sedentárias na ocupação dos tempos livres tais como televisão, vídeo, jogos de computador, entre outros. Torna-se de particular importância dar atenção ao excesso de tempo que a criança passa na posição sentada, bem como as respetivas consequências para a sua saúde. Assim, a educação e a promoção de uma vida ativa e saudável da criança começa na Família, desde cedo, em linha com as Recomendações Internacionais e com a Estratégia para a Promoção da Atividade Física. Os Encarregados de Educação deverão conhecer as recomendações e propostas dos Professores de Educação Física e dos Profissionais do Exercício especializados na intervenção com crianças.


Como estratégias práticas em que o movimento é fundamental, torna-se necessário:
  • "Dar espaço" à criança para brincar e mexer-se livremente em interação com o ambiente;
  • Incutir o mais cedo possível hábitos de prática física em contextos mais formais ou informais. Como exemplos, a daptação ao meio aquático, caminhadas, jogos, transporte ativo para a escola, ginástica, entre outros, são atividades que se podem iniciar muito cedo, ainda na fase pré-escolar;
  • Promover a prática de desportos coletivos, desportos de combate, natação, ginástica, dança, bicicleta, entre outros, que são exemplos de atividades que se podem iniciar no 1º ciclo;
  • Conhecer as várias formas de exercício/ desporto atualmente disponíveis, que mais agradem à criança/ jovem, ao nível do desporto escolar, de clubes ou centros desportivos, de atividades de tempos livres, ou de desporto de natureza;
  • Procura de profissionais de desporto/ exercício especializados nas atividades pretendidas - principalmente no que se refere à avaliação da condição física, à prescrição do exercício e à intervenção pedagógica - de forma a melhor serem adequadas à idade e capacidade da criança e respeitada a progressão na aquisição das respetivas competências motoras;
  • Perceber que o foco deverá ser o volume semanal de atividade física (em tempo e intensidade), ou seja, realizar no mínimo 60 minutos/ dia de atividade física moderada a vigorosa, que resulte de diferentes tipos de exercícios/ modalidades que sejam do interesse e gosto da criança, e que promovam e fortaleçam as componentes aeróbia, muscular e óssea;
  • Valorizar e elogiar as progressões e objetivos alcançados pela criança, quer seja na educação física e no desporto escolar, quer nas atividades físicas extra-escolares recreativas ou competitivas;
  • Respeitar os necessários períodos de brincadeira livre, alimentação adequada, repouso e sono, entre as sessões de atividade física;
  • Ensinar à criança a importância de um estilo de vida saudável e ativo que com certeza significará ganhos no futuro ao nível da saúde e desenvolvimento, transmitindo exemplos positivos;
  • Limitar o "tempo de écran" e o "tempo sentado", evitando a "especialização" em sedentarismo e excesso de jogos virtuais.

Visto isto, importa então referir os benefícios da prática de exercício físico/ desporto nas crianças e jovens e que podem ser sintetizados nos seguintes:
  • Melhoria da capacidade e eficiência em realizar tarefas motoras básicas e tarefas motoras desportivas (aumento da disponibilidade motora);
  • Melhoria dos resultados dos testes físicos aplicados nas escolas (ex.: Fitnessgram do Cooper Institute for Aerobics Research, ou Plataforma FITescola);
  • Melhoria da composição corporal;
  • Regulação e controlo do excesso de peso e da obesidade;
  • Regulação e controlo da pressão arterial elevada;
  • Prevenção de doenças cardiovasculares e outras;
  • Possível prevenção de lesões músculo-esqueléticas;
  • Melhoria da coordenação e equilíbrio (agilidade, ritmicidade, orientação espacial...);
  • Melhoria da força e flexibilidade e desenvolvimento de posturas corretas;
  • Melhoria da cognição, concentração e memória;
  • Criação de efeitos psicológicos positivos: melhoria da autoconfiança e da autoestima, melhoria do humor, diminuição do stress e ansiedade, prevenção e regulação de estados depressivos;
  • Promoção da convivência em grupo, divertimento e bem-estar;
  • Implementação da disciplina e do respeito pelos outros;
  • Estabelecimento de objetivos pessoais;
  • Estabelecer o exercício físico como um interesse a manter ao longo da vida, habituando a um estilo de vida saudável.


Por outro lado, o contexto desportivo implica a incorporação de valores, o respeito por regras e pelas outras pessoas, a aprendizagem sobre os limites individuais e coletivos, a gestão do sucesso e também do insucesso e, particularmente, a definição de objetivos e de uma disciplina, inerentes ao desporto, mas também aplicáveis a diversas situações ao longo da vida.

Nesta sequência, apresenta-se também uma prescrição do exercício para crianças e adolescentes, adaptado da American College Sports Medicine (ACSM, 2017):


Em suma, estão atualmente bem estabelecidos do ponto de vista social e científico, quer os benefícios da atividade física para a saúde pública, quer os riscos e custos do sedentarismo. As evidências científicas são esclarecedoras relativamente ao facto de o exercício físico, nas suas diferentes formas e estímulos proporcionados, e na sua adaptação às diferentes caraterísticas da população-alvo (neste caso, as crianças e jovens), ser um instrumento de saúde pública eficaz e que envolve recursos financeiros substancialmente inferiores, relativamente a outras intervenções, quer de prevenção quer de tratamento. Assim, torna-se fundamental promover a atividade física nesta fase da vida, favorecendo um estilo de vida mais saudável. Sem desculpas. Porque queremos os nossos filhos mais saudáveis e mais felizes!




Rita Santos Rocha